11.10.06

Nicotina

O filme mexicano Nicotina é de 2003 mas, como é de práxis com cinema não estadunidense, chega com enorme atraso às locadoras brasileiras, após uma breve passagem pelos cinemas. Deixemos as distribuidoras de lado e vamos ao filme.

Antes de tudo, por que o título Nicotina? Além da maioria dos personagens fumarem, acontece uma hilária discussão entre Nene e Tomsom sobre o cigarro. Nene, fumante, diz que não adianta parar de fumar, porque o que quer que aconteça é obra do destino, mesmo o câncer. Tomsom tenta demove-lo da idéia, mas o desenrolar do filme vai mostrar quem estava realmente certo...

Claramente inspirado pelo estilo de Quentin Tarantino, Guy Ritchie e do conterrâneo Alejandro Gonzalez Iñarritu (diretor de Amores Brutos), o filme tem como protagonista o caos. Pequenas coincidências que vão desencadear grandes reviravoltas e tragédias. Interpretado por Diego Luna (Terminal, E sua Mãe Também), um hacker voyeur, obcecado pela vizinha, chamado Lolo, consegue as senhas de um banco suíço. Intermediado por outros dois criminosos (Nene e Tomsom), Lolo pretende trocar o CD contendo as senhas por diamantes de um mafioso russo. Mas, quando chega no local da negociação, percebe que o CD verdadeiro fora destruído pela vizinha enfurecida quando descobriu que era filmada por Lolo. O CD que tinha em mãos continha apenas vídeos de Andréa, sua vizinha. Esse engano desencadeia uma série de mal-entendidos que dão corpo ao filme.

Influência de Guy Ritchie, corrida por diamantes e coincidências insólitas podem lembrar Snatch, Porcos e Diamantes, não é? Mas o filme não pretende, ao contrário do que apontaram alguns críticos, ser uma cópia do filme inglês. O diretor Hugo Rodriguez consegue impor um ritmo próprio a seu filme. Divisões de tela para mostrar mais de uma ação ao mesmo tempo são usadas corretamente. Um recurso utilizado para dar maior ênfase a pequenos detalhes também é bem interessante: desfocalizar o resto da tela, enquanto em um quadrado nítido é recortado algo ou alguém, à primeira vista imperceptível, mas que vai ser importante.

Além disso, o humor é mais negro e ácido. À medida que alguns personagens saem da trama, outros surgem atrás do diamante. Essa velha fórmula de personagens bastante definidos e estereotipados em busca de algo em comum, no caso os diamantes, funciona bem em Nicotina. Mesmo sendo a montagem aceleradíssima, há tempo suficiente para apreciar algumas relações, como a amizade entre Nene e Tomsom, e o amor obsessivo de Lolo por sua vizinha Andrea.

Enfim, a proposta do filme não é revolucionar o cinema. Suas 1:33 de duração (tanto fílmica quanto real) são bem aproveitadas, o que já é um mérito no cinema assumidamente de “entretenimento” atual. O pressuposto da teoria do caos, implícito naquele diálogo entre Nene e Tomsom de que “pequenas alterações geram grandes resultados”, tão em voga no cinema hoje em dia (Efeito Borboleta, Donnie Darko) é mostrado de forma eloqüente e divertida no filme mexicano.
* crítica originalmente publicada em Petshop - a sua ração cultural